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Traços de escritor, histórias de colecionador

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Exposição com caricaturas de Mário de Andrade, doadas por um de seus maiores colecionadores, acaba de entrar em cartaz no IEB

Por Isadora Martins

Carlos Alberto Passos (1923-2008) conheceu Mário de Andrade num encontro casual em algum elevador do Rio de Janeiro. Até então, o funcionário do Saps, Serviço de Alimentação da Previdência Social, pouco conhecia sobre a vida e obra daquele homem alto, bem vestido e de riso aberto a quem foi apresentado numa rápida viagem por entre andares. O breve e único encontro entre os dois foi suficiente para despertar em Passos uma profunda admiração e curiosidade. Mesmo após a morte de Mário, em fevereiro de 1945, ele dedicou muito de seu tempo livre a colecionar referências e recompor a biobibliografia do escritor de Pauliceia Desvairada.

Hoje, quem visitar o Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP pode conhecer uma parte do acervo inventariado por Passos: as caricaturas.  A exposição “Passos de um Colecionador” traz 35 desenhos do autor, assinadas por grandes nomes como Antônio Gabriel Nássara, Antonio Paim Vieira, Millôr Fernandes, Darcy Penteado, Hilde Weber, José Côrrea Moura, Nicolélio, Hippert e outros – muitas encomendadas a pedido do colecionador. A curadoria é dos professores Telê Ancona Lopez e Marcos Antonio de Moraes, com colaboração de Paulo José da Silva Cunha. Em cartaz até 22 de julho, divide espaço com a mostra “As Manhas do Barão”, que reúne frases irreverentes do Barão de Itararé.

Caricaturas de Mário Andrade nos traços de Baptistão (no alto da pág.), Claudio Duarte (abaixo) e de Antonio Paim Vieira

Passos guardou ao longo de sua vida um tesouro pessoal que ele sempre vislumbrou como coletivo. Foi em 1998 que resolveu doar sua vultosa documentação textual e iconográfica sobre Mário de Andrade ao IEB – cerca de 4 mil itens entre artigos, crônicas, ensaios em jornais e revistas, correspondências, estudos, fotografias, ilustrações, folhetos, cartazes de exposições e espetáculos. Conforme conta o professor Moraes, “muitas das figuras aqui expostas residiam antes nas paredes da casa do colecionador, que adorava falar sobre Mário, mas pouco dizia sobre si”.

Colecionando história, o que o funcionário público fez foi contar história: “Carlos tinha coisas que o próprio Mário não tinha em sua biblioteca pessoal. Nunca foi um estudioso. Era um interessado pela obra que colecionava não só pelo prazer de ter, mas de conhecer”, relata Moraes.

Humor e representação – Seja com nanquim, tinta, giz de cera, aquarela, lápis de cor ou feitos a partir de técnicas digitais, os traços bem-humorados das caricaturas revelam características homogêneas na maneira de representar a imagem do poeta e romancista, como o queixo protuberante, os óculos arredondados, a calvície e o rosto anguloso. Esse é o lado mais óbvio da representação caricatural. O outro, muito mais subjetivo, interpreta a personalidade e apresenta visões plurais sobre sua obra.

Assim, Luciano de Oliveira apresenta Mário ao lado de um dicionário do qual emanam notas musicais, chamando atenção para o trabalho do autor como polígrafo e sua constante busca pela relação da palavra com a música; ao passo que Cláudio Duarte coloca a face do modernista no corpo de Abaporu, obra de Tarsila do Amaral, numa referência à Semana de Arte Moderna de 1922. Em outra ilustração, Duarte explora a vasta correspondência que Mário manteve ao longo de sua vida. Enquanto Antônio Gabriel Nássara mostra um sujeito alegre e sorridente a brindar ao centro de um cenário da Taberna da Glória, conhecido bar carioca, Bruno Liberati traça o seu perfil ao lado de uma figura de Macunaíma, personagem emblemático do escritor e um dos primeiros anti-heróis nacionais, deitado numa rede.

“É interessante observar como um mesmo sujeito é interpretado ao longo do tempo, a partir de experiências múltiplas, e como sua imagem se consolida na imprensa e em outros meios”, comenta Moraes. Apesar de simpática, a arte na caricatura não deixa de apresentar nuances políticas. É o caso do trabalho de Baptistão, no qual Mário aparece escrevendo com a bandeira do Brasil como caneta. “Ele ganhou significado como um sujeito representativo do projeto nacional, dadas suas constantes pesquisas acerca do folclore do País”, afirma o curador.

Passos de um Colecionador permanece em cartaz até 22 de julho, de segunda a sexta, das 9h às 18h, no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), que fica na av. Prof. Mello Moraes, trav. 8, 140, Cidade Universitária. Mais informações pelo tel. 3091-2399. Grátis.

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