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Especialista comenta a importância da internet, seu cenário no Brasil e as novas formas de interação dos seres humanos com os computadores
O contexto histórico era a Guerra Fria: em um mundo bipolarizado, onde a iminência de conflitos armados estava sempre presente, Estados Unidos e União Soviética disputavam uma verdadeira corrida tecnológica em que qualquer inovação, qualquer ferramenta desenvolvida fazia a diferença. Diante disso, as duas potências compreendiam a necessidade e eficácia de maior desenvolvimento dos meios de comunicação.
Enquanto os russos se concentravam no lançamento do primeiro satélite artificial da Terra ao espaço, as pesquisas militares norte-americanas, comandadas pela Arpa (Advanced Research Projects Agency) do Departamento de Defesa, levaram ao desenvolvimento da Arpanet (Advanced Reserach Projects Agency Network), primeira rede operacional de computadores à base de comutação de pacotes, que atendia à comunidade militar norte-americana e conectava quatro universidades de diferentes locais do país. A inovação foi a precursora do que chamamos, hoje, de internet.
O resultado disso tudo vemos diariamente. A ferramenta se tornou algo tão importante na sociedade que alterou o padrão de comportamento das pessoas nas mais diversas áreas. Fazer compras, conversar com os amigos, ouvir música e até aprender, no século 21, funcionam de maneira diferente.
Marcelo Zuffo no novo prédio do Citi, que abrigará as atividades do centro a partir de janeiro de 2014
Segundo Marcelo Zuffo, professor do Departamento de Engenharia de Sistemas Eletrônicos da Escola Politécnica e coordenador do Centro Interdisciplinar de Tecnologias Interativas (Citi), são mais de dois bilhões de pessoas conectadas em todo o mundo. “Até o começo da década de 1990, a internet era vista exclusivamente como uma rede militar e acadêmica”, explica. “Mas por volta de 95 aconteceu sua transição comercial e, em menos de duas décadas, nos vemos diante do presente cenário.”
Mas a história não para por aí. Ano após ano as tecnologias se reinventam, agregam, e o novo padrão de comportamento se revela um tanto quanto mutante. “É esquisito o momento que vivemos. Há uma abundância enorme de tecnologias e uma dubiedade de comportamento. É uma fase em que a humanidade está se realinhando, se achando de novo”, declara o professor da Poli.
E não é para menos. O mundo está cada vez mais conectado. Segundo ele, só a ARM, empresa que fabrica microprocessadores, produz 25 bilhões de computadores – não desktops, mas sim microcomputadores no chip – por ano. Isso totaliza, fazendo uma aproximação, de 4 a 5 computadores por ser humano. Se incluirmos outros fabricantes, o número é ainda maior. Ele enfatiza os dados: “Como o processo obedece a uma curva exponencial, espera-se que em dez anos você tenha de cem a mil computadores por pessoa na face da Terra”.
Estimar como este cenário se apresentará daqui a uma década, aliás, é algo que o professor tem feito muito. No Citi, um Núcleo de Apoio à Pesquisa de Instrumentação que funciona desde julho do ano passado, Zuffo e seus pesquisadores – profissionais da Poli, Faculdade de Medicina e Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – têm como objetivo pesquisar a relação dos seres humanos com as máquinas, e tentam prever como será o mundo em 2022. “O que vai ser verdade? O que vai ser a humanidade em dez anos?”, questiona Zuffo, completando: “Nós acreditamos que os problemas fundamentais estarão na nossa relação com os computadores”.
Computação em nuvem
Desde o dia 1º de abril, a Secretaria da Receita Federal liberou, para aparelhos com sistema operacional Android e iOS (Apple), um aplicativo que permite o preenchimento e entrega da declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física por meio de tablets e smartphones. A Receita estima que cerca de 5 milhões de contribuintes poderão usar a novidade para fazer a declaração neste ano.
Não se trata de uma ação isolada. Temos visto, recentemente, o surgimento de situações similares que se tornaram possíveis com os avanços tecnológicos e difusão de aparelhos móveis. Existe um aplicativo que permite que médicos acessem exames de seus pacientes, outro que possibilita, aos professores, a criação de uma lista de chamada on-line com cálculo automático de frequência dos alunos. Os exemplos são vários.
O fato é que o homem moderno busca, hoje, mobilidade. Foi-se o tempo em que era necessário estar atrás de uma supermáquina para conectar-se à rede e fazer dos mais simples aos mais complexos trabalhos. Já se fala em um mundo pós-PC (Personal Computer). Vivemos o começo da era da computação em nuvem.
“Imagine centenas de milhares de computadores simulando outros computadores e oferecendo isso virtualmente para você em qualquer lugar do mundo. É uma verdadeira desmaterialização das máquinas. Tudo vira simulação”, explica Zuffo.
O fenômeno tem sido chamado de BYOD (sigla em inglês para Bring Your Own Device, ou “traga o seu próprio dispositivo”). Pesquisas da Cisco – companhia multinacional que oferece soluções para redes e comunicações na fabricação, venda e prestação de serviços – divulgadas no primeiro semestre de 2012 indicam que em 2016 o tráfego de dados via smartphones e tablets será 50 vezes maior do que hoje em dia. O IDC (Internet Data Center) revelou, no final do ano passado, que ao longo dos próximos quatro anos o número de pessoas no mundo com acesso à rede através de computadores deverá cair 15 milhões, enquanto o de usuários de dispositivos móveis crescerá 91 milhões.
A realidade brasileira
O Brasil quebra recordes em termos de usuários da internet e, ao mesmo tempo, em falta de estrutura para o uso da ferramenta em escala nacional. “São mais de 83 milhões de pessoas conectadas à rede. Dobramos o número nos últimos três anos”, declara Zuffo. “Mas enquanto nos Estados Unidos, por exemplo, todos os municípios têm acesso, aqui tem lugar que não possui nem energia elétrica.”
É claro que não podemos esquecer que vivemos em um país de dimensões continentais, e levar a estrutura necessária para lugares distantes do centro nervoso do País, como a Amazônia, é muito caro. O problema é que existem regiões na própria periferia da cidade de São Paulo onde a internet não chega.
Mesmo assim, há uma sobrecarga do sistema. “A infraestrutura não está acompanhando essa explosão de consumo, que tem muito a ver com o momento da nossa sociedade. Fazendo uma analogia, é como a questão do trânsito na cidade: a classe média inteira comprando cada vez mais carro, sendo que não temos rua para suportar isso.”
Para o professor, falta investimento na estrutura das conexões. “Temos um déficit de investimento na área de comunicações da ordem de 100 bilhões de dólares”, conta. “Isso tem que mudar. A Internet deve ser vista como uma área estratégica e prioritária, pois está envolvida com tudo.”
Na USP ela tem recebido a devida atenção. O projeto USP Sem Papel, tocado desde 2010, acelera os trâmites burocráticos da Universidade, deslocando serviços que acumulavam pilhas e mais pilhas de papel para a Internet. São exemplos o Patrimônio Web e o Currículo Web. Além disso, iniciativas como a parceria com a Univesp (Universidade Virtual do Estado de São Paulo) e a criação do E-aulas confirmam o importante papel que a Internet desempenha na educação em nível superior. Resta agora esperarmos pelas próximas inovações no campo.