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Momento de transição de uma tecnologia já estabelecida: como os diferentes grupos sociais estão lidando com a internet
Por Márcia Scapaticio
Para muitos, pensar na internet é pensar em não viver sem ela. Jovens e adultos já se comunicam de forma intensa pelas redes sociais e utilizam os serviços disponíveis na rede, mas pesquisas e fatos recentes alertam para alguns problemas, como a dependência da internet e de aparelhos eletrônicos, que podem acometer usuários que passam mais tempo do que o necessário conectados.
Atento ao impacto desse novo universo no cotidiano, o Instituto de Psiquiatria (IPq) da FMUSP disponibiliza tratamento para dependência tecnológica de internet e video games. Para a psicóloga e vice-coordenadora do projeto, Dora Sampaio Góes, são vários fatores que determinam uma possível dependência. “Óbvio que o tempo interfere, pois a pessoa entra para ver um e-mail e fica on-line por quatro ou cinco horas, não tendo o discernimento para dizer, agora tenho que sair. Igual a um jogador que entra no bingo para uma partida e passa a madrugada jogando”, explica.
Na própria Universidade há bons exemplos do uso da tecnologia, de responsabilidade do Departamento de Informática da Codage, da USP. Entre os sistemas, encontramos o JupiterWeb, que serve aos alunos e o MarteWeb, sistema de Recursos Humanos, no qual o funcionário pode acompanhar seus dados pessoais, realização de concursos públicos e visualização de holerites.
O professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA USP) Antônio Geraldo da Rocha Vidal afirma que o momento de transição já ocorreu: “Costumo dizer que a internet já é, seu estabelecimento como tecnologia se faz presente, desde a década de 1970, com o desenvolvimento dos computadores e da própria rede, mas o alcance do cidadão comum é recente, por isso muitas pessoas e organizações não estão acostumadas a ela, o que pode acarretar algumas dificuldades”.
Em contraponto com os indivíduos que possuem acesso à rede em suas casas, há uma parte da população que não tem pleno contato com essa tecnologia. Com a proposta de ampliar o acesso do cidadão a web, promovendo a inclusão digital e social, a Prefeitura da Cidade de São Paulo disponibiliza os Telecentros, locais onde os moradores que não têm computadores fazem cursos e utilizam, de forma gratuita, a internet.
Na sala do Telecentro Clube Escola Mario Moraes, a monitora Juliana da Silva Gabriel e a supervisora técnica Daniela Gonçalves esclarecem as dúvidas e ajudam os frequentadores .
Segundo Juliana, “o papel dos orientadores é apresentar as possibilidades, mostrar como é fácil aprender”. Daniela conta que já atendeu pessoas que tinham medo de usar o computador, “as dúvidas iniciais eram mas se eu quebrar, se eu apertar um botão e estragar?’Nós explicamos que não é assim, não é um bicho de sete cabeças, passamos confiança para elas”, completa.
O público do Telecentro são as crianças, que alternam o tempo na internet com a prática de esportes e dança; não substituindo o contato social pela realidade virtual. A psicóloga do IPq menciona que os dependentes da rede promovem muito essa troca, “uma característica forte é ter mais prazer na internet do que na vida real. Em termos psicológicos, o mais significativo é a construção de personagens. Segundo relatos de adolescentes, a sensação principal é de poder, eles se sentem queridos e não conseguem perceber que podem ser tão bons na vida real quanto são no mundo virtual”.
Para o professor da FEA, o lado prático da internet irá prevalecer sobre o negativo: “Na sala de aula aprendi como agilizar os estudos e torná-los mais produtivos. Há alguns anos, quando as ferramentas do computador começavam a ser utilizadas pelos estudantes eu perguntava em provas, por exemplo, o que era um editor de texto, pois se tratava de uma novidade. Certo dia uma aluna me disse que usava o editor desde criança e não sabia explicar. Na hora percebi o avanço desses recursos e que estava perguntando o que era energia elétrica, a aluna não sabia responder porque sempre teve contato com essa tecnologia”.
Juliana relata que inicialmente os Telecentros são procurados para os cursos e inserção no mercado de trabalho, mas quando eles têm acesso aos serviços da web, ficam mais animados para utilizar todas as possibilidades. “Esse é o nosso trabalho de inclusão digital. Os programas de televisão também estimulam a curiosidade pela rede, pois antes você escrevia cartas para os programas de auditório, agora, as inscrições são feitas pela internet. Eles ouvem acesse o site do nosso programa, vote nesse ou naquele para ganhar o prêmio e querem participar. Essa também é uma forma de inclusão social”, afirma.
Dora explica que esses são diferentes pontos de uma sociedade em construção e com o passar do tempo a realidade brasileira aprenderá com os seus próprios desdobramentos. “Podemos enxergar a internet através de uma perspectiva histórica, os avanços da tecnologia e seus impactos serão absorvidos, como aconteceu com a fotografia, rádio, televisão e outros meios de comunicação. Interagir e entrar em contato com várias pessoas, sem barreiras culturais e espaciais, é um dos aspectos positivos da internet e procuramos valorizá-lo durante o tratamento.”
Vidal confirma que a próxima era é a do conhecimento. “Organizar as informações recebidas e trocadas na rede é a outra etapa, vemos que a empresa que desponta nessa tecnologia é o Google, que traz as informações, os dados, mas não o conhecimento”.
O professor destaca que o conhecimento está na rede e muitos pesquisadores já falam em inteligência coletiva, indicando que a inteligência humana não está apenas em cada um de nós, mas no coletivo e a tecnologia da informação entraria para organizar esses dados.
Quanto ao caso específico do Brasil, o professor afirma que “a definição de políticas para aumentar o acesso à rede é necessária, pois um país que tem pouca difusão ou mau uso da internet tem seu desenvolvimento econômico, político e social comprometido. É importante lembrar que a internet é uma expressão da sociedade atual, os jovens são a geração da internet como eu fui da geração da televisão e o passar do tempo ajudará na convivência e entendimento dessas tecnologias”.