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Plantas medicinais: Entre a tradição popular e o uso médico

Algumas variedades vegetais receberam a aprovação da Anvisa e serão utilizadas pelo Sistema Único de Saúde

Por Márcia Scapaticio

Tratar as doenças com os recursos disponíveis na natureza foi a primeira forma usada pelo homem nos períodos históricos mais remotos. Desde então foram consideradas determinadas espécies eficazes para combater certos sintomas e doenças. Assim o chamado uso estimulado pela tradição é feito até hoje, mas os avanços da medicina e da indústria farmacêutica, juntamente com a ação das agências reguladoras, no caso do Brasil a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mudaram esse cenário e a utilização aleatória das plantas com benefícios medicinais passou a ser mais estudada e regulamentada.

Com longa experiência nessa área, Ceci Lopes, ginecologista da Faculdade de Medicina e presidente da Associação Médica Brasileira de Fitomedicina (http://www.sobrafito.com.br/), organização que estimula a aplicação racional e científica dos princípios terapêuticos das plantas, explica que “fitoterapia é qualquer tratamento com planta, seja um chá ou um medicamento sintético, vendido em farmácia. Muitos remédios são originários de fitoterápicos, mas passam por modificação química ou purificação do princípio ativo quando são industrializados”.

Estudos mais recentes de Salatino abordam os benefícios do Própolis

A relevância de algumas espécies vegetais não escapou ao olhar do Ministério da Saúde, que em 2006 lançou a Política Nacional de Práticas Integrativas, que apresenta mais opções para tratamento na rede pública. Além da fitoterapia, incluem-se a homeopatia, acupuntura e medicina Chinesa. A implementação desse projeto é incentivada pela Organização Mundial da Saúde, não só no Brasil, mas em outros países ao redor do mundo.

Segundo informações do próprio Ministério, o financiamento de fitoterápicos começou efetivamente em 2007.  Atualmente são um total de oito medicamentos industrializados que têm as plantas como princípio ativo e foram aprovados pela Anvisa. Os escolhidos são: alcachofra, aroeira, cáscara- sagrada, espinheira santa, garra do diabo, guaco, isoflavona de soja e unha-de-gato.

O professor do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências Antonio Salatino explica a sua atividade no laboratório e revela que um dos seus trabalhos atuais é feito com o própolis com suas funções anti-inflamatórias e antissépticas, um produto da apicultura, mas que tem as substâncias retiradas das plantas. “Nós procuramos determinar a composição química das plantas, fazer análises de atividades biológicas e também mantemos contato com colegas de outras instituições.”

Ele conta uma história que ilustra as evidências do uso de plantas: “O homem das neves é o corpo humano muito estudado, mais até do que algumas múmias. Seu corpo foi achado nos Alpes e levado para a universidade. Junto a ele havia uma bolsa que continha casca de bétula, provavelmente usada como um medicamento. Hoje sabemos que a casca contém ácido betulínico, que tem atividade anti-HIV, inibindo a replicação do vírus”. “Mas ainda nenhum de seus derivados está sendo efetivamente utilizado”, completa.

Ceci defende o uso consciente das plantas medicinais

Sobre a aplicação cotidiana, a ginecologista Ceci traça um paralelo importante, dizendo que até o solo no qual o vegetal foi plantado influencia no resultado final e cita a hortelã. “Às vezes usamos um chá achando que estamos tomando um remédio. Temos a hortelã do supermercado e a plantada na horta, as variedades do solo e da própria espécie, além da forma de preparo, que extrai as substâncias de modo mais ou menos concentrado. Tudo isso faz muita diferença na hora de tomar a bebida e em seus resultados”, alerta.

Sobre práticas oficiais, ainda este ano, o Ministério da Saúde abrirá vagas para um curso de orientação para profissionais que queiram se capacitar em fitoterapia, o que beneficiará a relação com os pacientes, lembrada por Ceci, que recomenda atenção. “Não deve haver uso aleatório e desinformado. Não podemos usar a máxima ‘se não faz bem, mal não vai fazer’ ou é natural não faz mal’. As pessoas que usam fitoterápicos devem avisar os médicos, pois os princípios ativos podem interagir com o medicamento e provocar reações perigosas.”

Para promover uma maior divulgação do uso das plantas, haverá o curso Fitoterapia Aplicada à Ginecologia, ministrado no HC, com a participação da médica, que sentencia: “É um terreno delicado, que deve ser trilhado com muito cuidado, ao mesmo tempo em que não posso recusar, não posso usar sem saber, por isso é necessário para os profissionais buscar o conhecimento e para os pacientes buscar a informação divulgada por estes”.

 

2 comentários sobre “Plantas medicinais: Entre a tradição popular e o uso médico”

  1. Paulo Freitas disse:

    É muito alentador ver professores e profissionais sérios e competentes apresentarem, mais que pontos de vista, experiências e comprovações de que os recursos terapêuticos oferecidos pelos vegetais ou seu derivados são ainda hoje alternativas viáveis e eficazes no tratamento de doenças e manutenção da Saúde, se adequadamente aplicadas. A formação de recursos humanos e profissionais da área de saúde – especiamente os médicos. prescritores dos fitoterápicos – que detenham este conhecimento para sua correta aplicação, é tarefa que se faz urgente neste momento. Me parece, um apelo e um alerta, às Faculdades e instituições de ensino do nosso Brasil !!! E a USP está caminhando neste sentido ???

  2. Lene disse:

    Para O prof. Pirani

    Senhor docente, quero saber do seu conhecimento a respeito da calumba, minha recolhia raiz desta nos cerrados de MS e GO, sei pelos habitantes destas regiões que esta está em extinção.

    Sou aluna da FFLC e tive o grande prazer em assistir algumas aulas do senhor aí no IBUSP.

    Aguardo retor e fico-lhe muito grata.

    Lene

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