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Grandes eventos como a Copa do Mundo têm sido considerados sustentáveis, mas claramente privilegiam o viés ambiental em relação ao social e econômico.
Sustentabilidade
Recentemente, o mundo vem presenciando uma “onda verde”, em que um selo de sustentabilidade é adotado por uma empresa como um símbolo de valor. Na prática, o que acontece é que indústrias, governos ou mesmo pessoas podem ser adeptos de atitudes mais ou menos ambientalmente corretas. Mas o significado do que é ser sustentável, de fato, acaba não sendo preenchido por completo.
A Copa do Mundo da Fifa no Brasil, mesmo, promete ser o “mundial da sustentabilidade”. Os estádios em construção ou em processo de reforma parecem obedecer às normas da construção civil sustentável. Na página do Portal da Copa na internet, quando pesquisada a tag “sustentabilidade”, surgem inúmeras notícias acerca do tema. Todas sobre como os estádios são eficientes e limpos energeticamente falando, ou sobre como os gases emitidos durante o mundial serão mensurados caso necessitem ser reduzidos ou compensados.
Tudo isso é inegavelmente positivo. Mas o equívoco cometido por muitos é limitar o assunto apenas ao seu aspecto ecológico, quando, de fato, ele vai bem além disso.
A sustentabilidade não necessariamente está ligada só à questão ambiental. Na verdade, para ser entendida em sua plenitude, deve abranger no mínimo três eixos indissociáveis: além do ambiental, o econômico e o social. “Não há como se pensar acerca da temática sem termos em mente que ela diz respeito não à ecologia de modo isolado, mas a uma complexa rede de relações que inclui a natureza e que nela não se esgota”, explica a professora Luciana Bongiovanni Martins Schenk, do Instituto de Arquitetura e Urbanismo de São Carlos.
Este é um assunto importante atualmente. Vivemos na era do consumo e do descarte, da obsolescência programada, do processo de urbanização e mecanização da agricultura, e de todo um conjunto de aspectos que é capaz de, em um curto espaço de tempo, destruir grandes territórios. “Essa aceleração gera um rastro desolador em sua passagem. Nisso, nossas cidades são apinhadas com graves problemas de mobilidade e ficam sujeitas a desastres ambientais como enchentes e desmoronamentos”, exemplifica a professora.
Aprofundando no conceito
Até mesmo por isso, o mais adequado talvez seja falar em cidades mais sustentáveis. Para o professor Alex Abiko, do Departamento de Construção Civil da Escola Politécnica, o próprio conceito de cidade já a impossibilita de ser totalmente sustentável. “Nas cidades usamos água, energia e espaço em uma quantidade muito superior à que teremos condição de repor”, diz. O calor produzido nas ilhas de calor em que se transformaram inúmeras metrópoles também está incluso nessa lista de fatores não renováveis, além do volume de lixo gerado, que não consegue ser reabsorvido em sua totalidade.
Por indícios como esses, o professor acredita que não seja possível uma grande área ser completamente sustentável. É claro que existem cidades como Dongtan, na China, e Fujisawa, no Japão, projetadas com essa finalidade. Mas, ainda que funcionem dentro de seus objetivos, são exemplos muito ínfimos diante da dimensão mundial. “Eu posso fazer um edifício sustentável, mas construir uma cidade inteira assim é uma outra coisa em uma escala muito maior.” Esses lugares com propostas de funcionamento integralmente sustentável podem servir como piloto, como um laboratório, um teste, até mesmo uma vitrine e uma peça de marketing.
Onde, então, está a solução?
De acordo com Alex Abiko, a interseção entre os eixos sustentáveis (econômico, social e ambiental) se encontra quando existem medidas que os contemplem por igual. No caso do lixo, por exemplo, pode ser estabelecida uma política de reciclagem, mas, se a população não assimilar o hábito cultural e socialmente, ela será falha. Não basta simplesmente possuir recipientes apropriados para coleta se as pessoas não estão ou se não forem acostumadas a utilizá-los da maneira correta. Por outro lado, não adianta ser recolhida uma quantidade enorme de plástico por meio dos processos de reaproveitamento se não é dada uma destinação econômica para o material.A professora do IAU concorda que construções pontuais, mesmo que numerosas, podem não formar um todo. Segundo ela, uma cidade sustentável não é um amontoado de edifícios com alta performance tecnológica. “Pensar em sustentabilidade urbana é pensar especialmente em uma sociedade que usufrui de suas cidades. Para isso são necessários espaços públicos de qualidade, ruas, praças e parques, um sistema de espaços livres que congregue sua população. Que leve a cidade para além do lócus de reprodução do capital.”
A Copa do Mundo no Brasil
A Copa a ser realizada este ano tentou se adaptar aos tripés sustentáveis, mas sem se desligar do que aconteceria especialmente com o econômico. Para a realização do mundial no País, houve um grande e predominante investimento financeiro na construção dos estádios. Abiko diz que, baseado no que já leu e conversou, estes investimentos parecem muito distantes das necessidades das cidades. “O resultado é muito discutível.”
Isso quando analisado do ponto de vista positivo. Documentos e estudos recentes mostram que megaeventos não reduzem a pobreza de um país depois que acabam. Não obstante, podem deixá-lo com inúmeros gastos extras, como acontece hoje com a África do Sul, por exemplo, que despende muito dinheiro em um estádio que não oferece mais tanta utilidade, mas que também não vale a pena ser demolido.De acordo com informações da Relatoria Especial da ONU para o Direito à Moradia Adequada, nos últimos três anos, a relatora especial e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) Raquel Rolnik recebeu inúmeras denúncias sobre autoridades de várias cidades-sede da Copa do Mundo no Brasil desalojarem pessoas à força para a realização dos megaeventos. Sem aviso ou tempo para negociação, famílias foram expulsas de suas muitas vezes humildes casas e realocadas para lugares onde sua condição de vida talvez fosse mais complicada.Somado a algumas carentes medidas sociais governamentais, isso talvez possa ser justificado pelo fato de o Brasil parecer ter realizado tudo sob o clima de euforia. “Nós não temos, neste país, uma cultura do planejamento. Não só planejamento urbano, mas não planejar simplesmente. É tudo para o ‘agora’, e começam a fazer as coisas sem projeto”, diz Abiko.Luciana também não se mostra muito esperançosa quanto aos resultados. Dos exemplos que conhece de locais-sede de grandes eventos, diz que a maioria terminou por privilegiar uma parte da cidade em detrimento de outras. “Com a Copa não tem sido diferente. A privilegiação do imediato e não da estrutura em sua totalidade é a regra, infelizmente”, diz.
Em termos concretos
Antes de números, a sustentabilidade é um horizonte – algo que se almeja e persegue, que se constrói cotidianamente. Uma vez que o aspecto econômico é uma das pernas do tripé, todos estão suscetíveis a uma lógica que está em esferas para além da cidade. “Contudo, cabe à população e aos dirigentes conhecer esses interesses e, desejando essa mudança, construí-la”, diz Luciana Schenk.
Independentemente do que indicam os rankings e à parte eventos periódicos, o que existe de concreto são cidades que estão se transformando para incorporar a questão da sustentabilidade. Nessa adaptação, a participação dos cidadãos é, de fato, fundamental, e já tem que ser pensada desde a elaboração da política pública. Um pressuposto básico, então, é a cidade querer ser mais sustentável. Depois desse interesse coletivo fundamental, são aplicadas ações em função da realidade de cada lugar.
Assim, além de medidas governamentais, a educação social parece ser a grande chave para lidar com esses desafios. “Ela talvez seja capaz de criar as condições para o desenvolvimento de uma sociedade crítica e informada. Digo ‘talvez’ porque não se trata de alfabetização e curso vestibular, trata-se de desenvolvimento do espírito crítico, e para isso precisamos de investimento, especialmente na figura do professor”, afirma Luciana.
A imagem que as pessoas costumam ter do processo de gestão de sua cidade é de que é algo complexo, burocrático e confuso. Por isso a transparência que propõe a sustentabilidade se dá pelo processo de informação, que, “associado ao espírito crítico, potencialmente pode chegar a construções concretas de cidades sustentáveis”. Em outras palavras, para chegar a resultados palpáveis é imprescindível informar e construir socialmente, porque isso é alcançado, em especial, pelas pessoas.
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