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Além de grandes referências bibliográficas e obras autorais, o acervo é composto por análises e trabalhos de um profissional internacionalmente reconhecido
Por Raphael Martins
Victor de Mello, ex-professor do Departamento de Estruturas e Fundações da Escola Politécnica (Poli), sonhava em contribuir permanentemente com a Universidade. Viu, na doação de seu acervo pessoal, a melhor forma de ajudar.
Claro, esta não era uma simples biblioteca, mas um riquíssimo acervo que conta com marcos da Engenharia Geotécnica, periódicos e manuscritos de um professor e profissional referência na área. Tudo arquivado separadamente, em um novo espaço que se encontra dentro da Biblioteca Professor Doutor Telemaco Van Langendonck de Engenharia Civil da Poli.
Inaugurado no dia 9 de junho, o Espaço Victor de Mello foi projetado pelos netos do professor, os arquitetos Gil Soares de Mello e Lucas de Mello Alessio, e contou com colaboração de seu filho Luiz Guilherme de Mello e Waldemar Hachich, ambos professores do departamento. Victor de Mello também participou ativamente no projeto, mas não pôde ver o resultado final – faleceu em 1º de janeiro de 2009. A diretora técnica da Divisão de Biblioteca da Poli, Maria Cristina Olaio Villela, conta: “É importante ressaltar a vontade que ele tinha de doar isso tudo para a Escola Politécnica, mas, infelizmente, ele não viu o sonho dele concretizado. Mas, os netos, que projetaram o espaço, mostraram-no ao professor, antes do seu falecimento”.
A supervisora da biblioteca da Engenharia Civil, Maria de Fátima da Silva Lanza, comenta o pedido do próprio professor para que as obras ficassem em um espaço reservado, que não integrassem o acervo geral, por se tratar de uma biblioteca bastante específica e especializada.
Segundo Maria Cristina, são mais de 1.800 obras, quase 200 títulos de periódicos e mais os valiosos projetos de seu escritório. Seu acervo tornou-se uma divisão da Biblioteca da Engenharia Civil, totalmente integrada ao Dedalus – Sistema Integrado de Bibliotecas da Universidade – através da sigla AVM (Acervo Victor de Mello), podendo, assim, ser consultado por qualquer aluno. O professor Waldemar Hachich tenta descrever sua importância. “Na nossa área, é seguramente a melhor biblioteca da América Latina. Eu não falo mais para não exagerar. E ela tem uma característica muito peculiar, que são as anotações, onde ele fazia comentários sobre o que estava escrito ali, às vezes remetia a outras publicações. Traz todos os comentários de uma pessoa que teve um papel fundamental na Geotecnia do mundo. Saber o que ele pensava sobre o conteúdo das publicações é algo único”, explica.
Nascido em 15 de maio de 1926, em Goa, na Índia Portuguesa, Victor Froilano Bachmann de Mello foi admitido no Massachusetts Institut of Technology (MIT) em 1944, para cursar Engenharia, optando em seguida pela especialização em energia elétrica. Fez o doutorado em obras hidrelétricas, também no MIT.
Em 1949 veio para o Brasil, a convite da empresa Light, para trabalhar na divisão de Geotecnia. Participou de importantes projetos de complexos hidrelétricos no eixo Rio-São Paulo. Mais tarde, passou a atuar como sócio-diretor na Geotécnica S.A. O sucesso dos projetos da empresa desencadeou um convite para ministrar aulas na pós-graduação do MIT, em 1966. Pouco depois, retorna ao Brasil para fazer carreira na Victor F.B. de Mello & Associados, como engenheiro consultor, participando de grandes projetos, como a primeira linha do Metrô de São Paulo. Paralelamente à nova empresa, Victor de Mello inciou sua carreira como professor na Universidade de São Paulo, dando aulas de Geotecnia.
Em uma de suas turmas, encontrava-se o atual professor Waldemar Hachich. Ele conta que, além de profissional renomado e referência na área, Victor de Mello era, também, um excepcional professor. “Ele fazia questão de excelência, em todos os sentidos. (…) Se você visse as anotações de aula, ele fazia questão de colocar toda a informação disponível, inclusive chamando atenção para o que era ruim. Essa questão de sempre estimular o olhar crítico era uma característica fundamental do jeito dele de ensinar”, lembra. Descrito por Hachich como uma pessoa polêmica, que gostava de debater, provocar, criticar e ouvir críticas – alguém que estimulava o gosto pela profissão.
O acervo montado no Espaço Victor de Mello percorre não só a experiência profissional de um mundialmente renomado engenheiro, mas também de um incrível professor. Waldemar Hachich finaliza ressaltando o valor da doação do professor Victor de Mello à Escola Politécnica: “Saber suas observações e tudo o que ele pensava sobre o que estava impresso nessas revistas, nesses trabalhos é algo muito bacana para a formação das gerações futuras”.